Revista Finestra Ed. 33 – Entrevista Igor Alvim

Sonho dos arquitetos é possível de ser realizado

Engenheiro mecânico por formação, o consultor de esquadrias e fachadas Igor Alvim comemora 15 anos de atuação no setor, fazendo parte da restrita lista de profissionais que conhecem a fundo um mercado que vive em total ebulição. Para ele, projetos de fachadas cada vez mais complexos colocam o consultor como parceiro do arquiteto e exigem nova postura dos fabricantes de esquadrias que buscam aperfeiçoar suas empresas, tanto no aspecto administrativo, quanto na linha de produção.

Com duas empresas, uma delas voltada para as áreas de projeto e consultoria e outra para o desenvolvimento de software de planejamento para a produção de esquadrias, Igor Alvim afirma que, graças à criatividade dos arquitetos, cidades como São Paulo estão povoadas de prédios de grande qualidade estética e técnica. “O sonho é livre e tecnicamente possível de ser realizado”, diz ele nesta entrevista a Ledy Valporto Leal.
O mercado registrou, nos últimos anos, grandes mudanças na tecnologia aplicada à construção de fachadas. Os sistemas utilizados atendem às exigências de conforto termoacústico?
Atualmente contamos com velocidade de fabricação e de instalação muito boas, além de sistemas com ótimo nível de estanqueidade à água, realmente eficientes. Ocorreram grandes mudanças, especialmente no método de instalação. Os sistemas utilizados hoje permitem a montagem por dentro.

Com isso, há uma série de vantagens: a velocidade com que as janelas são colocadas no local da obra, por meio de um processo motorizado, a garantia de que elas chegam íntegras, protegidas de batidas. Também são eliminados os riscos de o operário trabalhar pelo lado de fora, sujeito à precariedade dos andaimes, e de queda de ferramentas, especialmente no caso de prédios construídos no alinhamento.

É necessário conhecimento especializado para instalar esses sistemas?
Eles estão no mercado há cerca de dois anos, mas hoje sua aplicação é corrente. Entretanto, não é qualquer serralheria que pode utilizá-los. É necessário que a empresa tenha maquinário eficiente, esteja bem relacionada com um extrusor e capacitada para a leitura de um projeto. Afinal, tudo que estiver no papel deverá ser seguido. Portanto, em sistemas desse tipo, o planejamento é fundamental.

Então vale a pena as empresas investirem em planejamento?
O tempo que se ocupa com a etapa de planejamento é largamente recompensado com a rapidez na montagem da fachada. Para termos uma idéia, uma fachada de 16 mil metros quadrados de um prédio de escritórios pode ser montada em dois meses.

Como essas mudanças têm repercutido na estratégia das empresas?
Alguns fabricantes de esquadrias ficarão à margem desse segmento do mercado. Eles podem até querer participar, mas não têm condições. Faltam pessoal especializado e equipamentos eficientes, tanto de software e medição, quanto de identificação, como os equipamentos de ultra-som que mostram a presença de ferragens nos pontos de furação. Creio que apenas cerca de 15% das empresas que atuam no mercado estão capacitadas para fazer isso. A maioria vai ficar com sua janelinha de mão, porém com uma janelinha de mão mais eficiente, pois esta é também uma imposição de mercado. Não se pode admitir ineficiência num produto que responde por aproximadamente 15% do valor do edifício.

Essas mudanças ocorreram apenas em projetos de edifícios comerciais? 
A revolução maior ocorreu nos prédios comerciais, mas ela também está presente nos residenciais. Cada extrusora ou distribuidora procurou criar uma linha mais eficiente do que as antigas linhas 25 ou 30, atrasadas meio século, que nem sequer escova de vedação tinham, mas ainda são usadas em certas regiões brasileiras por pequenos serralheiros.

Qual a interferência dessa nova tecnologia na concepção arquitetônica?
Os arquitetos hoje vêem o consultor como um parceiro. Antigamente, o consultor era contratado somente para dar parecer. Essa postura mudou e hoje ele faz o projeto, sendo quase um departamento técnico do serralheiro. Isso possibilita ter uma definição do conceito do projeto da caixilharia antes do fechamento da obra, o que auxilia significativamente, por exemplo, na realização da concorrência. Sem esse recurso, as distorções quanto à qualidade das esquadrias serão significativas. O arquiteto passou a utilizar esse tipo de apoio. Ele define que resultado plástico quer obter e os consultores, como escritórios de projeto, desenvolvem a concepção.

Como as escolas de arquitetura têm abordado os avanços tecnológicos na construção de fachadas?
Cabe uma crítica ao ensino: é inadmissível um jovem se formar em arquitetura sem saber a diferença entre uma janela de tombar e uma maxim-ar. O formando deveria ingressar na vida profissional dominando os princípios básicos necessários sobre o assunto, coisa que não ocorre. O que vejo, na prática profissional, é um desequilíbrio, por exemplo, entre o grau de informação sobre um telhado e sobre uma fachada. O primeiro apresenta detalhes de caibros, terças e beirais etc., enquanto as esquadrias têm informações sumárias.

Nesse sentido, qual o recado que você passaria aos arquitetos?
O sonho é livre e possível de ser realizado. É graças ao sonho dos arquitetos que cidades como São Paulo estão povoadas de prédios de grande qualidade estética e técnica.

Em que etapa da obra o consultor de esquadrias deve começar a atuar?
É desejável que isso ocorra desde o momento em que o arquiteto estiver concebendo a fachada, a caixilharia. O sonho é importante – e olha que às vezes o arquiteto sonha, o consultor sonha e os donos sonham mais ainda -, mas é preciso controlá-lo. É dessa relação íntima e inicial que surgem os melhores resultados. Um projeto de arquitetura estuda, logo no início, a cor, o tamanho e a espessura do vidro, para identificar qual deles atenderá ao coeficiente térmico desejado, como serão as lajes e os vigamentos, como o prédio vai trabalhar em termos de estrutura – se haverá flechas nos pavimentos.

Para otimizar o trabalho do consultor, quais os pontos básicos que o projeto de arquitetura deve definir?
Em princípio, há condições de atender a todas as determinações do arquiteto. No entanto, é necessário considerar que, conforme a natureza de sua concepção, o custo irá variar. Dependemos, portanto, das disponibilidades de desembolso do empreendedor. Então, a relação concepção/custo tem que estar definida desde o início do trabalho de consultoria.

Como está a evolução tecnológica de componentes para esquadrias?
Tem ocorrido grande desenvolvimento tecnológico e muitos componentes e acessórios foram ou estão sendo nacionalizados. O que me parece faltar é obediência às normas técnicas estabelecidas para o setor. Elas não são impositivas, são indicativas. Mas, havendo um problema, elas serão tomadas como referência. Normas para concreto armado ninguém ousa desobedecer, porque isso afeta diretamente a segurança do prédio. Normas que se referem a aspectos considerados secundários, como guarda-corpos de sacadas, tendem a ser desconsideradas.

E os vidros, que novidades apresentam? 
Dispomos de vidros com ótimo desempenho térmico, alguns importados. Creio que a Europa domina a tecnologia mais avançada, com a Bélgica à frente. A Glaverbel tem a maior planta da Europa e fabrica vidros com sistema fotovoltaico que capta a luz solar e a transforma em energia elétrica, direcionando-a para o consumo energético do edifício. Mas seu custo é muito elevado e nós trabalhamos com um período para o retorno do capital investido bem menor que o de alguns países europeus, que pensam num horizonte três ou quatro vezes maior. Há também os vidros low-e com índice de reflexão praticamente zero. Veja os casos das torres de controle de aeroportos: sistematicamente seus vidros são inclinados, em razão dos inconvenientes da reflexão. Hoje, essas superfícies podem ser na vertical, dada a disponibilidade de vidros anti-reflexivos.

De que maneira está sendo resolvida a passagem do som de um andar para o outro nas fachadas-cortina?
Trata-se de problema gravíssimo, que hoje é considerado questão prioritária – primeiro, o isolamento acústico em relação à rua e, depois, de um andar para o outro. Há um tripé a ser considerado: ar-condicionado, esquadria e acústica. Em alguns casos, como aeroportos, a questão é crítica, devido ao som ensurdecedor das turbinas dos aviões e ventos consideráveis. Esses inconvenientes têm que ser resolvidos, de fora para dentro, com o emprego de vidros mais eficientes, tanto térmica quanto acusticamente; de um pavimento para outro, a solução está nos forros acústicos absorventes, como a lã de rocha.

Como é possível racionalizar custos com as esquadrias sem comprometer a qualidade?
Hoje o arquiteto lança a idéia e o projetista de esquadrias faz tudo. Sem esse projeto, acabamos comparando produtos distintos. É importante esclarecer que um projeto, para ser eficiente, não pode ter uma linha exclusiva. Não cabe ao consultor, por exemplo, fazer uma linha de janelas. Ele tem que definir uma idéia, inclusive os perfis, mas esse produto será feito, no caso, pelo extrusor. O construtor contrata a empresa extrusora, que desenvolve os perfis pensados pelo construtor, e não o contrário.

Ainda predomina a cultura de redução de peso como fator de redução de custo das esquadrias?
No mundo inteiro, a esquadria é especificada por metro quadrado e não por quilo. Qual a razão? Ora, se uma janela que antes pesava oito quilos teve seu peso diminuído para cinco quilos, seu preço não pode ser reduzido nessa mesma proporção, uma vez que a área do perfil a ser pintado ou anodizado não sofre alteração, pois independe da espessura. Portanto, o raciocínio não pode ser por quilo. Os preços devem ser diferenciados, deve-se montar um custo analítico, levando em conta cada tipo de janela e cada tipo de sistema. Em outras palavras, deve-se considerar o tempo gasto na sua fabricação e na sua instalação e agregar a isso o custo da mão-de-obra, a matéria-prima e os acessórios. Acrescentados ao total o BDI e os impostos, temos o preço final. Se o critério for por quilo, haverá grave distorção no preço: o serralheiro tanto poderá estar ganhando quanto perdendo 200%. No entanto, é bom lembrar que esse procedimento analítico exige a utilização de sistema informatizado para chegar ao custo correto.

E quais as conseqüências da redução de peso das esquadrias? 
A redução repercute na matéria-prima, mas não afeta os gastos com mão-de-obra. Exemplo: convencionou-se que um critério correto para dimensionar os custos de uma esquadria simples era multiplicar por três o custo da matéria-prima. Com a redução do peso dos perfis em cerca de 50%, digamos, esse critério, necessariamente, deverá ser revisto, uma vez que, apesar da queda de 50% no preço da matéria-prima, o custo da mão-de-obra não sofre alteração. A manutenção desse critério, muitas vezes por imposição das empreiteiras – que, além de ter ciência do peso total das esquadrias, são as responsáveis pela compra da matéria-prima -, tem levado serralherias à quebra.

Existem softwares direcionados para os fabricantes de esquadrias? 
De nada adianta produção eficiente se não houver controle de custos também eficiente. Desenvolvemos um software, através da empresa MDQ, que permite ao serralheiro ver sua fábrica por dentro e fechar todo esse emaranhado de valores. Tecnologia, ele encontra no mercado. Por isso deve começar a pensar nos sistemas de desenhos e de controle de custos, na qualidade da fábrica, na ISO 9 000, em máquinas mais automáticas. É a reengenharia. E com isso se obtêm controle gerencial, redução de custos e aumento da produtividade.

Qual sua opinião sobre a produção de esquadrias em canteiros de obras? 
É admissível a fabricação de esquadrias no canteiro, desde que nele se instale uma fábrica. Simplesmente levar para lá uma máquina e duas furadeiras não é solução, é improvisação. Perde-se totalmente a qualidade. No entanto, se colocarmos uma indústria no canteiro, em lugar apropriado, protegido, para receber as máquinas que estariam na fábrica, é possível obter bons resultados. Na verdade, o principal ganho com a transferência da fábrica de esquadrias para o canteiro está relacionado a impostos. Não concordo com essa transferência. Penso que uma esquadria deve ser produzida na fábrica, pois é aí que se consegue obter qualidade. Na fábrica estão presentes o gerente, o encarregado, enquanto no canteiro quem responde por essas funções é um operário, trabalhando em condições insalubres e sem a necessária segurança. Fazer uma esquadria no canteiro deve ser encarado como exceção, e não como regra.

Publicada originalmente em FINESTRA
Edição 33 Maio de 2003

http://www.arcoweb.com.br/entrevista/igor-alvim-o-sonho-26-05-2003.html